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sexta-feira, 18 de setembro de 2009

COLEGIO ATHENAS-FKB III - HUMANIDADES

Sociedade, Ética e Cultura.

Entre os valores que todas as culturas criam, necessariamente – sejam eles bons ou ruins – existem aqueles que dizem respeito mais de perto às ações dos homens entre si, aos seus comportamentos individuais e coletivos.
De maneira sumária, portanto, a Ética é uma investigação ou ciência dessas condutas – tanto dos motivos, das formas, quanto das finalidades das ações.
É por meio da ética – da filosofia moral, isto é, da reflexão sobre as condutas e da consciência moral subjetiva – que estabelecemos os códigos públicos ou privados, ou seja, que determinamos um comportamento moral concreto, objetivo.
É pelo recurso à ética que chegamos a perguntas como: que ações merecem ser realizadas por nós que produzam mais felicidade do que sofrimento?; que tragam mais prazer do que dor?; que criem condições efetivas de bem-estar social e não de injustiças?; que estimulem mais o conhecimento e a criatividade do que a ignorância e a apatia?; que encorajem mais a solidariedade e a paz do que os conflitos?
Constatamos por essas perguntas que na Ética está implícita a idéia não de uma conduta qualquer, mas a da melhor conduta.
Mas ainda assim é cabível a seguinte pergunta: não seria a melhor conduta aquela que responde ou se coaduna imediatamente com a natureza e com suas necessidades primárias?
Por exemplo: conservar-se vivo a qualquer custo, competir brutalmente pelo alimento, atacar antes de ser atacado, satisfazer a todos os impulsos, conseguir o prazer sob qualquer circunstância?
Embora possamos adotar essa atitude, e nossos ancestrais pré-históricos o fizeram (muito antes de numerosos contemporâneos que nela insistem), é claro que, neste caso, permanecemos no âmbito estrito da natureza, regidos pela lei do mais forte, do “homem lobo do homem”.
Certamente serão valores de uma sociedade, mas de uma sociedade que os antropólogos costumam chamar de horda primitiva ou de barbárie. E só com muitas dificuldades e rodeios teóricos nos atreveríamos a qualificá-la de “grande cultura”, ou seja, de uma cultura no melhor sentido com que o homem já pôde concebê-la e praticá-la.
Ao contrário – ou pelo menos bem distanciados de uma ética apenas natural –, podemos imaginar a prática de certos bens e virtudes, ou o cultivo da inteligência e dos prazeres como condutas ideais, nas medidas mais apropriadas possíveis.
Aqui, cabem à razão e à experiência conduzirem a análise e perceberem que a própria qualidade daqueles valores justifica a sua adoção. Pois, convenhamos, seria absolutamente fútil e inútil preocuparmo-nos com seus contrários – o mal e os vícios, a estupidez e os sofrimentos.
Ora, para que se possa evitar a guerra permanente ou reduzir ao mínimo os conflitos inevitáveis ou a degradação das coisas há a necessidade de valores culturais e, com eles, de princípios e de procedimentos comuns, artificialmente construídos. E a primeira peça para a construção de uma tábua de conduta mutuamente aceita, de um código de valores significativamente cultural, consiste no reconhecimento do outro.
E para melhor explorar as relações entre valores e sociedade, tomo a liberdade de me concentrar neste que considero o valor primordial de nossa sociedade pluralista e moderna – refiro-me àquela que foi construída no Ocidente desde o Renascimento.
Quero dizer com isso que, no lento e difícil trajeto de nossa cidadania e de seus valores, a tolerância foi o passo inicial desta viagem ainda hoje inacabada. Seu primeiro significado social esteve ligado à convivência pacífica entre confissões religiosas e preferências ou interesses políticos.
Felizmente, a liberdade de crença converteu-se em direito civil e a possibilidade de participar do poder pela escolha de representantes converteu-se em direito político, ao menos nas sociedades democráticas.
Hoje, a idéia de tolerância modificou-se. Trata-se agora da aceitação das minorias étnicas e lingüísticas, assim como da indiscriminação sexual.
Mas é claro que a nova tolerância não pode ser ampla o suficiente para que nela caibam atrocidades físicas ou mentais, tais como a tortura, a pedofilia, o trabalho escravo ou infantil, o vandalismo, a corrupção ou a agressão irresponsável do meio ambiente.
Com isso quero dizer que a tolerância não pode tolerar as más-razões, sob pena de assumir a ética do natural, a do mais forte, da exploração e da violência.
Mesmo porque, quem age conduzido pelas más-razões não é, ele mesmo, tolerante. Despreza os valores que o reconhecimento do outro transmite a uma cultura fundada no respeito: o valor da reflexão racional, da persuasão, da igualdade perante a lei, da dignidade pessoal, da qualidade de vida ou da justiça social.
Ao mesmo tempo, a aceitação do multiculturalismo, que é a tolerância a valores singulares, étnicos, historicamente delimitados e constitutivos de um povo, necessita de um valor prévio e absoluto: o respeito à pessoa alheia.
Esse valor básico não implica a renúncia à própria verdade cultural ou a indiferença a qualquer verdade. Ao contrário, garante a preservação das culturas em suas diferenças e a integridade e a dignidade dos indivíduos que delas participam.
Em outras palavras, o multiculturalismo – que expressa valores particulares e com eles a riqueza da criatividade humana – deve estar precedido e baseado na tolerância. Só assim ele se universaliza e ganha o respeito que a ele se deve.
Finalizando, o respeito ao outro, sinônimo de tolerância, talvez seja o primeiro valor, o princípio ético fundamental das sociedades modernas. Ele funciona como a lança de Aquiles – capaz de curar as feridas causadas por sua luta, uma luta em nome dos direitos humanos, da liberdade de pensamento, da igualdade de direitos, da dignidade social da vida.
Por DaniloSantos de Miranda

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